domingo, 10 de novembro de 2013

Moça Lua - uma linda lenda indígena

(Reeditado)

Esta semana comecei a ler alguns novos livros infantojuvenis, entre eles a “Moça lua e outra lendas” (acabei de ler).

O autor Walmir Ayala, reconta 19 lendas indígenas brasileiras, sobretudo do Sul do Brasil.
Como adoro ler e contar lendas e mitos reproduzo a primeira lenda do livro.


Moça Lua


Só havia a noite e o dia. 
E a noite era tão escura que deixava os homens assustados e aconchegados em suas casas, ao pé do fogo. 
Na tribo só uma índia não tinha medo da noite. Ela saía na escuridão e voltava com os cabelos  cobertos de vaga-lume, e andava na beira do rio e todos ficavam tranquilos porque ela contava que não havia perigo. A índia era muito branca e não tinha medo da noite escura.



Havia outra índia de olhar escuro como a noite que não via aquilo com bom coração. A inveja crescia dentro dela como a urtiga que arde. 
Um dia tentou caminhar noite adentro, mas não foi vista e cortou os pés nos gravetos e seixos da margem do rio. 
Quando tentou cantar, houve uma revoada de morcegos escuros, e seu canto era como riso de hiena.
Então a índia invejosa foi falar com a cascavel:

- Cascavel, preciso do teu serviço.
- Pra o bem, ou pra o mal?
- Pra o mal.
A cascavel bailou feliz. Sua vida e seu veneno estavam a serviço dos maus trabalhos:

- Que queres que eu faça?
- Que mordas o calcanhar da índia branca.
- A que não tem medo da noite?
- Esta mesma.
- Pra matar?
- Que fique escura, verde e MUDA.
A cascavel mais uma vez saltou de alegria e prometeu:
- Hoje mesmo.

De noite a índia branca foi fazer seu passeio... A cascavel se arrastou e ficou debaixo de uma pedra esperando. 
Quando a índia branca passou cantando, a cascavel deu o bote. Mas a índia branca tinha os pés calçados com duas conchas de madrepérolas e a cobra quebrou os dentes e perdeu o veneno:

- Índia infeliz, o fizeste comigo!
- O que pretendias tu fazer comigo?
- Eu ia te fazer escura, verde, velha e MUDA.
- Fui salva pelo sapato de conchas que o boto me deu.
- E eu fiquei sem dentes e sem veneno.
- Porque tu querias me transformar? - indagou a índia branca.
- Porque tu és muito linda, e a índia escura não suporta que vivas aqui...
- Ela mandou?
- Ela sofre.

Então a índia branca começou a chorar. E as lágrimas eram gotas de luz, tão leves que foram flutuando e permaneceram no céu. Todos os índios se espantaram com aquilo... a noite já era menos escura.
Assim a índia branca chorou muito e disse:
- Não posso viver entre os que me odeiam. E passou por cima das águas do rio, até outro lado. A cascavel meteu-se num buraco e nunca mais saiu.

A índia branca chegou do outro lado e procurou a coruja:
- Mãe coruja, ajuda-me a chegar ao céu.
- Filha linda, pede e eu farei.
Então a índia branca foi colher cipó e flor-de-manacá. Trançou tudo e fez uma escada linda como os amores.


Árvore de Manacá







Pediu à coruja:
- Voa bem alto e suspende a escada para que eu possa subir.
A coruja obedeceu e chegou até a porta do céu com a maravilhosa escada. A índia branca foi subindo. Chegou no céu, acomodou-se numa nuvem e ficou. Estava tão feliz que a coruja desceu  com a escada sem fazer ruído, pois a índia branca, fatigada, dormia. 
E nunca mais voltou. Os índios viram então aquela forma reclinada, branca e brilhante, vagando entre nuvens, rodeada de lágrimas de luz. 
Disseram:
- A lua, a lua.
A índia escura e invejosa olhou e ficou cega de ódio. Dizem que foi morar na cova da cascavel, nunca mais foi vista. 
Moça Lua, no entanto, continua até hoje a povoar a noite. E os homens sonham, um dia, poder construir uma escada igual à dela, para ir ao seu encontro.





História retirada do livro: “Moça Lua e outras lendas” de Walmir Ayala e ilustrações de Simone Matias


Nenhum comentário: